sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Na Gaiola




Quem disse que pássaros engaiolados não voam?
Voam sim,
Limitados, mas voam...
É que as gaiolas não podem deter a força do instinto
De aves que imaginam o mundo.
As grades não podem deter a imaginação de quem já provou a liberdade.
E liberdade não é isso?
Liberdade meu senhor,
é possuir o mundo lá fora onde as flores nascem,
conhecer os rochedos mais altos,
tocar os rios mais ternos,
mergulhar abismos,
atravessar fronteiras,
é saber que tudo isto habita o ser que anela,
e mesmo sem ver, pode-se enxergar o já visto.
Daqui da gaiola apenas sonho com o que já conquistei,
conquista feita no espírito;
aspiro pelo que possuo nas lembanças.
A fé é um instrumento da liberdade,
ela nos faz possuir antes de receber,
ver antes enxergar.
A fé não considera as prisões,
e muito menos as gaiolas,
ela pondera os limites,
mas sobrevive da liberdade.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Mares Azuis




A vidraça suja não ofuscou o brilho do olhar,
A poeira ainda estava ali quando o sol raiou,
E com ele amanheceu a minha alma silente.


O amor sempre desperta nessas horas,
Ao som do canto dos pássaros encantados,
E nas janelas dos olhos o tempo desliza na neve.


A brancura dos montes lá fora quebranta o desejo da partida,
Os pés seguem os sonhos enquanto estes constroem estradas,
E minha alma navega em mares azuis de céus com estrelas.

Sou poeta de ontem que hoje fabrica o amanhã,
Poetas são seres passageiros que tecem o para sempre,
A poesia não é efêmera, descança na pedra da eternidade.

Não sei como os poemas nascem,
Se num lampejo de transcendência, num beijo no eterno,
Ou apenas um hálito do Espírito que evoca o ignoto.


Eu sei como os poemas sobrevivem ao tempo e ao vento,
Eles fecundam o belo e o profundo na alma de quem ama,
Milagre que insere vida nas palavras descritas com afeto.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

O Roceiro


Eu venho da roça, não nego,
Sou brejeiro; sei plantar milho e feijão.
Nas mãos, trago os calos da enxada,
E meus pés caminham firmes para o tabuleiro.

O suor do meu rosto esconde as lágrimas,
Ambos rolam na face que cansou de esperar
A chuva que insiste em não vir.
Por aqui os ipês floridos desabrocham cedo.

A cabana escondida fica lá no alto da serra
Ali abrigo os sonhos, meus medos e meu sorriso de menino.
Da janela eu vejo o sol e a brisa toca a minha tenra pele,
O mar eu sequer posso ver, mas para que o mar se amar é dom mais profundo?

Vejo-me menino nas ruas de outrora,
Ruas que os meus pés já não pisam mais,
E que meu coração não resiste visitar em tempo de nostalgia.
Sou menino de ontem num corpo de agora: doce alegria.

Bolinhas de Gude




Quando criança nós amávamos brincar na rua,
Muitas vezes, esta nos acolhia afavelmente,
Nela éramos heróis e bandidos e a cada lance do olhar,
Uma atividade nova convidava nossos corpos lúdicos para dançar.

Eu amava jogar bolinhas de gude.
Pés descalços, consciência sem culpa e na alma o amor pela vida,
Triangulo desenhado no chão, três covinhas enfileiradas e uma linha distante.
Nosso olhar seguia aquelas coloridas esferas que rolavam no chão do nosso amor.

Eu era bom naquilo que fazia,
Mas na rua havia aqueles que eram melhores que eu.
Bolinha ia, bolinha vinha e o tempo parava para nós.
O tempo sempre pára e espera a quem sonha.

Eu ainda sonho,
Sonho com o que não sei definir,
Desejo o mundo, mas num instante tudo se fragmenta,
Na pedra da realidade,

Sob a foice das horas que anunciam o tempo de acordar.

Eu cresci,
Mas ainda guardo minhas bolinhas de gude,
Numa lata no telhado de uma dessas casas que guardam nossa infância.
Jogar gudes é como brincar com o vento:

a gente simplesmente se deixa levar.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Só Corro




Eu corro de tudo que não gosto nesta vida,
Corro do ódio,
Do medo,
Da solidão,
E da injustiça.

Fujo de alguma coisa que não sei nomear do inconsciente.
Corro do que me ameaça.
Corro do ontem,
Corro do agora,
Corro, simplesmente corro.

Corro de mim mesmo,
Corro dos outros e de tudo,
Corro por ai e faço do tempo um esconderijo.
Corro porque não aprendi a fazer outra coisa.
Corro porque amo correr.

Às vezes corro do relógio,
Corro veloz,
Brinco; escondo-me, mas corro sem parar,
Corro porque o mundo e as horas correm,
Corro porque tudo está em movimento.

Corro para o amanhã,
Fujo do ontem,
Corro de tudo que se chama desespero,
Abrigo-me em silêncio no colo do vento,
Que corre por ai fazendo seu circuito.

É assim que vivo a minha vida,
Corro, corro e corro.
Se acaso quiseres me encontrar,
Por favor, alongue os passos e corra.
Fujo de tudo que não se chama amor.

À Espera da Lua




Hoje o vento rasteiro decidiu soprar na colina da minha solitude.
Daqui de cima eu avisto o sol tímido e sobranceiro entre as nuvens,
O cicio da brisa na grama me faz adejar na alma sobre as sombras das nuvens no chão.

As horas parecem não passar e o coração distante dita a prosa num monólogo eterno.
Onde será que dá o fim dessa estrada?
A porteira continua aberta e a minha alma silente vê passar as boiadas de volta para os currais.

O cheiro de mato molhado me devolve a terra, meu lugar de origem,
E o azul destila o meu espírito que possui o céu de estrelas tímidas,
Logo ali acima da minha cabeça e eu aqui à espera da lua.

Sinto o amor verdejar ao meu entorno,
Sinto Deus calar-se enquanto me observa,
Sinto a vida que decorre de seu hálito/afeto e sinto-me: sorriso, silêncio e paz.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

O Céu Da Favela



O sol estava ali com um rubro diferente,
O céu parecia uma tela surrealista pintada à espátula,
Tudo dizia da ternura do Criador e meus olhos o viram.
O morro viu o mar e engravidou-se do céu.

A lucidez do meu pensamento desenhou no papel o verso,
A prosa de ontem tornou-se poema de hoje,
Mistura fina na vida de quem apenas viu o mar amar o pescador;
E este retornando com suas redes cheias de víveres e anedotas.

No terreiro da favela meninos corriam ao léu,
E os atabaques soavam ao longe,
Canções de negros fujões que ainda hoje habitam a cidade,
Morada dos aflitos, terra de ninguém.

As lavadeiras meu senhor, já estão no rio desde manhãzinha,
Os lençóis estão alvos e as águas rumaram com o rio,
Seguiram silentes para lugares distantes,
Ali onde os sonhos se escondem e onde a alma anela estar.

Os barracos se vergam ao calor e às chuvas.
Pobre gente brasileira, esta sim, se verga ao sofrimento,
Fabrica o carnaval, a arte e o samba,
Faz da sobrevivência sua labuta diária, e sonha, apenas sonha.

O Leão e eu




Às vezes eu me sinto como uma criança,
Desprotegida e serelepe andando por ai.
Minha alma brinca com o tempo,
Meu corpo desliza no vento,
E meus pés ligeiros, são velozes como os dos leopardos.

Eu fujo do ontem, por isso eu corro,
Corro de toda dor que me imprime tristeza.
Mas, descobri que não sou rápido o bastante na fuga,
Pois, o passado sempre me alcança e domina.

Eu gosto da idéia de que Deus é Leão:
O Leão da tribo de Judá.
Um leão ao que me parece, é muito veloz,
Corre bastante para proteger sua prole.

Toda vez que eu clamei por ajuda,
Deus veio ligeiro como um Leão a socorrer-me.
Com ele eu aprendi a correr e tornar-me forte.
Sinto-me criança aos seus pés,
E ao seu lado o homem mais forte do mundo.

Uma Arte


Monet, Picasso, Renoir e Van Gogh pincelam novas possibilidades,
Lispector, Neruda, Meireles e Pessoa descrevem o amor em versos,
E Gonzaga faz da Asa Branca uma tela em verso que emoldura o nordestino.

O nordestino é isso mesmo: uma arte,
Cantando, vivendo, fazendo ou apenas sendo,
Um ser-ai-no-mundo onde o amor é mais que uma porção de algodão-doce.