quarta-feira, 9 de março de 2011

Os Selvagens Existem!



Há pouco tempo eu visitei uma tribo indígena com as minhas pequenas. Aquele foi um tempo maravilhoso, num lugar inesquecível ao lado de pessoas amáveis. Tudo naquele espaço natural encantava os olhos, pelo menos os meus, mas eu descobri que nem tanto para os das minhas filhas, visto que numa caminhada entre as itaquenas uma delas, a menor bradou – “papai onde estão os índios selvagens?”. Ali eu notei o quanto a minha resposta poderia frustrar ou fazê-las desfrutar daquela terra paradisíaca.   
        Elas passaram horas a fio conversando com o cacique da tribo entre suas casas de sapê, sobre areia alva, a beira de um mar de beleza sine qua non e de um rio tomado por brilho do sol como espelho d’água. Imediatamente, tomado por uma repentina reflexão filosófica eu disse – “nas cidades minhas filhas, nas cidades, os selvagens estão nas cidades!”
        Imagino que sua tenra mente formou uma imagem de índios invadindo ruas, praças e casas das cidades. No entanto, sequer ela imaginava que eu me referia aos homens urbanos. Há coisas mais selvagens que as urbis e que as polis? A minha filha ainda não entende do capitalismo selvagem, embora já esteja sendo flechada por sua ferocidade.
        Se elas imaginassem a selvageria dos políticos em cada prefeitura, nas licitações e contratos públicos. Se elas soubessem a maluquice dos bastidores atrás dos véus das religiões e templos pelo Brasil a fora. Se elas sequer sonhassem com a selvageria nas instituições mafiosas do futebol, da Judiciário, dos militares, das cadeias, das instituições bancárias e bem como na que se dá mesmo entre os ambulantes nas feiras-livres, dos empresários e políticos traficantes. Ah se elas soubessem dos grileiros, da corrupção na FUNAI, entre os ambientalistas, no Congresso Nacional, no Palácio do Planalto, nos hospitais e de outros tantos que por ai vão matando índios e não-índios em terras ainda virgens e indígenas.
        Não havia naquela tribo nenhum selvagem, havia sim homens gemendo suas próprias desgraças.
        Eu penso que ver o mundo como as crianças vêm é a melhor forma de ver. - "É na cidade filhas que a selvageria habita, é nas cidades!"
        Daí eu as fiz entender que suas avós eram índias casadas com descendentes de escravos e que estes não faziam medo algum. O perigo estava lá fora vestido de terno e gravata. Togados.
        Eu as fiz entender que índios selvagens é coisa do tempo da carochinha. Agora selvagens somos nós, todos nós filhos da modernidade. 

terça-feira, 1 de março de 2011

Absorto!


O peso do vento me faz levitar nas lembranças.
O campo de alfazemas cobre de lilás a terra saudosa.
O aroma suave enternece o céu de Laguna,
E meu coração transpira à canção do adeus.
O orvalho ainda rega o roçado enquanto a seringueira sangra.
Em meu peito o silêncio do amor que vem de longe, voa partindo,
Com a poeira na estrada que transporta a cana caiana ao cair da tarde.
Para onde vão as aves?
Amanha o Sol surgirá na linha do horizonte,
Lugar de onde os meus olhos esperam a aurora.
Sinto-me sozinho em ruas esquecidas de velhas ruínas.