“Amigo é coisa para se guardar debaixo de sete chaves dentro do coração”.
Cantou um poeta citando outro seu igual.
Eu tenho poucos amigos; a vida impõe as distâncias.
Porém, os poucos que tenho distam em tempo e espaço.
A verdadeira amizade está em extinção.
Minha geração sorve silente o amargor da solidão.
Há pelo menos cinco grupos de pessoas quem me cercam:
Os estranhos, aos quais dirijo a palavra raras vezes com os quais tenho um contrato social.
Os colegas, com os quais convivo superficialmente, candidatos a amigos, conhecidos.
Os inimigos, os que nem são estranhos, mas andam no círculo dos colegas,
Os traidores, ex-colegas, candidatos a futuros inimigos contra os quais o silêncio é a melhor palavra.
E os raros, muito raros amigos.
A esses eu conto nos dedos.
Hoje vivo numa ilha, lugar seguro para a alma devota ao amor.
Nesta, erigi uma ponte, um caminho para aqueles que desejam abrigar-se no azul do oceano.
Um poeta não pode ser uma ilha sem pontes.
Porque um poeta é um fazedor de pontes.
A poesia não sobrevive sem amor.
O amor não sobrevive sem pontes.
Sem o amor e a poesia eu não sobrevivo.
Vivo sobre tudo que não é só areia ou água.
Subsisto à falência da inocência e da pureza no mundo.
A sinceridade é pão dormido, assado no forno da desilusão.
O amigo de hoje pode ser a desgraça de amanhã.
O sorriso de hoje gesta a lágrima de dias vindouros.
Tapas leves nos ombros que esperam a lâmina fria de punhais odiosos.
“Até tu Brutus?”, Grito que ecoa na surpresa desgostosa.
O manto da traição faz eclodir nos altares hodiernos os Judas pós-modernos.
A amizade é coisa em extinção, o que existe mesmo é a selvageria do ego.
“Ama ao teu próximo como a ti mesmo”. Disse o Criador.
Todavia dizem os egos selvagens: existe alguém mais próximo de mim do que eu mesmo?
Eu sou o meu próximo!
Vivo num mundo onde se cultua a auto-amizade, amor sem pontes.
Nada contra o auto-amor, mas isto não pode traduzir-se no fim da amizade.
O fato é que é possível encontrar ainda amigos mais chegados que irmãos.
No entanto, dê-me uma lanterna, pois ao meio dia, sob a luz do sol os procurarei.
Ando a perguntar-me se sou um bom amigo.
Eu mesmo não saberia responder, visto que não me sinto bom nem amigo na relação de auto-amizade.
Prefiro ser feliz na relação de alteridade, no altruísmo, como um construtor de pontes.
Não sou heterocêntrico, contudo abomino o autocentrismo.
Não sou centro de nada.
Vivo na órbita do mundo e à minha órbita sobrevivem os que me amam.
Ou seja, aqueles que a despeito de meus limites e fragilidades simplesmente não me abandonam.
Nesta constelação vejo poucos astros.
“A amizade é coisa linda...”, disse um poeta,
“... é como unha e dedo, participar segredos. Ter alguém pra conversar COMIGO...”
A verdadeira amizade é como um rubi precioso,
Quem a possui preserve-a ou de súbito será roubada.
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