quinta-feira, 30 de abril de 2009

Paijelança (Pajelança)




Elas estavam lá quando nublou o céu,
Meu espírito aventureiro anunciou-me a festa vindoura,
Alegria de mim repartida entre nós,

feito pão da ceia,
Da última ceia que o Senhor deu aos seus amigos.

Eu estava lá, era eu mesmo,

Sem nós pelas costas,
Alegria feita gente, carne e osso de vidas que se amam,
Uma só carne de amores eternos;
Chuviscos frescos na pele molhada pelas águas de Deus.

Elas mal esperavam aquela repentina atitude;
A casa quente e sólida não pôde conter o corpo que se esvaiu;
Pés ligeiros, alma saltitante, feito índios na dança da chuva,
Eu saí sorridente abraçando o vento,

Pajelança de quem toca a canção da alegria ao coraçao de Deus.

Seus olhos brilhavam, enquanto me viam,

Sedentos por eternidade,
E eu, fiz-me forte ante o tempo que me roubara a infância;
Seus pés seguiram os meus sob as gotas da chuva, a qual em amor,
Regou o amor, a vida e eternizou o instante.

O quintal parecia os de outrora;
Corpos molhados, olhos lacrimando e a alma anelante adejava.
Elas gritavam enquanto banhadas pela ternura do meu olhar,
Dançamos juntos, olhos inundados por gotas e lágrimas,

Na chuva, enquanto eu presenteava o amor.

Aquelas horas jamais serão esquecidas;
Talitha, Tábatha e eu, correndo na chuva,
Algazarra de meninos que sorvem o tempo;
Paternidade feita afeto,

Flores eternas postas em vasos de barro.

Para nós o tempo não pára,
Mas para que o tempo se a eternidade estava ali,
Ao estender das mãos,

No fundo do quintal?
Nós três e Deus, dançando na chuva.


sexta-feira, 24 de abril de 2009

A Cor Do Meu Poema




Hoje quero falar das cores, visto que, meu amor é como o céu.
Amo a cor do pôr-do-sol quando se dá ao ocaso,
Minha alma se alimenta da cor das marés em mares diversos;
E os meus olhos se deliciam com a cor das manhãs de outonos.

O tom da tempestade me apavora, sua escuridão desafia o meu espírito.
Nada como a cor dos seringuetes; savanas de sonhos distantes,
Ali onde o arco-íris não é pardo nem a saudade é lilás.
Os meus pés caminham sonhos de ontem em tapetes persas.

O douro de Midas anuncia a alquimia do afeto ao toque das mãos,
Alentejo encantado em pegadas na areia de dias passados.
A cor da poesia é verde quando a verde mata, mata a estrada,
E apaga os caminhos, as veredas que foram feitas nas andanças.

A cor de âmbar me emudece os olhos,
Cor de mel que morena a pele sedenta o afeto.
Doira a alma que rumina contos infantis em tecidos de calhamaço.
Minha esperança tem a cor do sorriso das crianças.

A cor da saudade meu senhor, combina com a cor de dias alegres.

Os poemas têm cores diversas, cores de anelos.
a cor do meu poema é furta-cor,
alquimia da palavra calada no olhar; poesia em reverso.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Pelo ralo



A dor que transporto agora navega em mar aberto,
O cais está distante do olhar que deseja ancorar,
Um túnel escuro de nuvens carregadas e densas
Esconde meu barco que veleja entre abismos.

O arco-íris não veio,
O sol não deu a sua luz,
O vento sequer apareceu,
E eu meu senhor, parado aqui, respiro à sombra da escuridão.

Das gaivotas ouço apenas as vozes,
A terra firme parece estar perto,
Mas, quem disse que há mais firmeza na terra que no mar?
Ilude-se quem pensa que o mar não é sólido.

Ainda me lembro daqueles homens gritando na rua:
Olha o quebra queixo!
O outro dizia:
Olha a taboca!
E ainda outro:
Bolinho de puba!
Meu mundo solitário transporta-me às cavernas do passado.

Essa era a gastronomia de meninos fujões nas ruas,
Dinheiro pouco comprava o prazer da vida feito por mãos distantes.
A neblina cobre meus olhos enquanto sonho,
Sonho o amor que fragilmente se escondia lá em casa,
Quando minha mãe chegava de não sei onde.

Estômagos vazios não sonham nem despertam o amor,
O amor meu senhor, é afeto de abraços de mãe presente.
O amor meu senhor, é isso mesmo, a vida feita em atos.
Ato puro, sincero de quem deseja, incondicionalmente.
Deus é ato puro, puro amor.

Meu barco ainda está aqui,
Suportando a frieza das horas que não passam,
Mesmo, que o relógio, queira negar o dito.
Ah! Que saudade do colo da minha mãe.
O porto seguro te asseguro, um dia virá.

O cicio do vento forja a esperança no silêncio,
O medo já não mais ameaça,
Calo em mim a dor que transporto silente,
Calo a voz que grita e afugenta as aves,
Calo-me, enquanto a poesia escoa pelo ralo.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Não quero ser mais poeta




Um poeta é o ocaso da racionalidade,
Mero acaso que enrubesce o sol,
Ocaso do acaso de certezas sepultadas nas nuvens.

Um poeta meu senhor, é dor que anda,
É prosa, é verso, é clamor,
É silêncio sem fim no túnel da palavra.

Não quero ser mais poeta,
A sociedade dos poetas morre,
Só os mortos da sociedade dos poetas mortos ainda vivem.

Quero ser menino sem sombra,
Fantasma de mim em terreiros de outrora,
Quintais de sossegos na tapera de seu Né.

Dona Guiomar já pôs o feijão no fogão a lenha,
O milho já está assando e os olhos não se cansam
De ver a montanha que esconde o sol.

O sol seu menino,
Escondeu-se, quando meu olhar desejou seu sorriso,
E daqui, do topo dessa mangueira vejo o balanço balançando ao vento.

Não quero ser mais poeta,
Poetas morrem sozinhos,
Quero ser um zangão para sair zangado por ai.

Quero ser vendedor de algodão doce,
Pois, aguça o olhar das crianças, a despeito da roupa que veste,
Não quero ser mais poeta, pois, os poetas não morrem mesmo se sepultados.

Não quero ser mais nada,
Apenas desejo terminar o que comecei sem pedir,
Meus dias de sóis e prosas de versos vazios de mim.

domingo, 5 de abril de 2009

Sombras


Olhar de crianças é cheio de imaginação e magia,
Simboliza a tudo que toca e toca a tudo que significa.
Crianças percebem mundos,
Mundos invisíveis às almas reféns dos anos.

Crianças nomeiam seus heróis e inventam seus inimigos,
Ai no lugar dos medos mais profundos,
Distraem-se enquanto elaboram fantasias,
Fantasiam enquanto aninham segredos que fazem calar o espírito e eclodir a ternura.

Sombras de si projetadas nas paredes de quartos à meia luz.
As sombras existem porque a incidência da luz é roubada.
É quando alguém se interpõe entre a luz e o olhar.

Nas paredes dos quartos onde vivi muitas imagens se fizeram vida,
Às vezes, eu mesmo gestava as minhas próprias sombras,
Era senhor da imaginação e ali, no lúgubre espaço de dormir
Fazia surgir aves, animais, flores e formas num simples gestos das mãos.

Muitas vezes temi as minhas próprias criações
E via o olhar da minha irmã aturdido ao percebê-las vivas.
A parede do meu quarto era o mundo das sombras vivas,
Ali as nossas horas passavam e o melhor de nossos dias
Burlava o tempo entre abismos.

Enquanto crescemos as sombras crescem conosco;
Elas apenas mudam de paredes: das exteriores para as interiores.
E o tecido da alma corroído pelo tempo serve de tela para as imagens oníricas.

E suas imagens refletem nossos medos ou alegrias.

A vida adulta não está destituída de sombras,
Dentro de nós elas existem e ainda nos ameaçam.
As sombras das vivências de ontem maculam as paredes da vida de hoje.
Elas existem ali nos lugares inacessíveis da alma,
Onde poucos passos percorreram e parcos olhos notaram.

Todo ser humano possui uma sombra,
Consciente ou inconscientemente; quer queira quer não queira;
Não me refiro àquela que o sol ou a luz fazem surgir na estrada,
Mas àquela que somente o coração plenamente sincero sabe existir:
Medos, desejos e defeitos negativos, coisas que quer esconder de si e dos outros.

O mal das sombras é que elas existem para corpos que não são transparentes.
A transparência é virtude de poucos, da alma que transporta a luz.
Durante pouco tempo as crianças transparecem seus espíritos,
Mas, logo a vida lhes impõe a necessidade das sombras,
E estas meu senhor, nos seguirão até o fim da nossa travessia.

Nossos pais tiveram suas sombras,
Deus tem uma sombra: antropomórfica.
Nossos heróis e vilões tiveram sombras,
Peter Pan teve uma sombra.
A sombra meu senhor, é parte da nossa condição humana.

Sombra boa é aquela que os cajueiros nos dão no sertão,
Mas, a mais excelente delas é 'Sombra do Altíssimo',
A única que nos abriga de nossas muitas sombras
Que nos esgotam enquanto caminhamos sob o sol causticante.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Poemas de Deus





Um poema nasce dum instante,

Poema é música do espírito,

Transcendência feita verso que se espalha no olhar.


Transcendência meu senhor,

É amor que fomenta a vida que eclode aqui e além de nós,

É o profundo de uma interioridade que draga a eternidade,

Que coze a certeza que a razão quer negar.


Transcendência é espiritualidade que exala o ser,

O ser que contempla o mundo à sua volta e se cala;

É poema que inscreve o inaudito e emudece ante o indescritível.


Poema é transcendência,

Poesia é espiritualidade,

Salmos são poesias de quem transcende a si mesmo na adversidade,

Somos todos poemas de Deus “feituras suas”.


Deus é verbo,

Deus é verso de amor de amores inversos,

Somos todos, poesias decantadas no fundo do pote.

Uma Pluma



Uma pluma,

O vento brinca enquanto percorre instantes,

Sua leveza traduz seu destino incerto,

Mas para que certezas se ninguém as tem?

Flutua meu mundo num flerte indomável,

Levita meu corpo para que despertem os sonhos.

Aladin passeia em seu tapete mágico voador,

Peter Pan vence a gravidade,

E eu na pluma, viajo intensamente a vida que gesta poemas de amor.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Morte e Vida





O homem teme a morte que o ameaça diuturnamente;

O não-ser é o fim da linha do trem de sua existência,

E existir é sua mais profunda necessidade.


A morte pede carona todos os dias na embarcação da vida;

A vida viaja no bonde da ilusão e viceja na relva da ternura;

Sua cor é azul, seu tom é de um branco amor;

Vida breve é vida sem carinho.


Vida breve senhor,

É aquela que se desfaz quando quem a gente ama vai embora.


Viver é nosso maior dom, a nossa mais profusa vocação.

Eu vivo,

Pois, vivendo amo a vida e as pessoas que passam.


Da janela lateral do meu medo vejo a sombra do passado.

Sinto em mim a dor de quem partiu,

De quem partindo, partiu-me em pedaços.


Somos como as árvores: morremos várias vezes no ano;

Todos os dias caem as nossas cascas.

Ontem eu morri,

E me pergunto hoje: que lugar é este que estou?

Não sei dizer, deve ser qualquer lugar entre a saudade e a esperança.


Ontem eu morri,

Morri porque sou semente,

Sou grão de trigo nascido na estrada;

“Se o grão de trigo caindo na terra não morrer, fica só, mas se morrer dá muito fruto”;

Sendo assim, sou grão somente.


A morte já não pode matar que vem de outras mortes para a vida.

A vida que vivo agora é a única possível de se viver,

A vida que gente como eu,

Que vence a morte, a perda e a solidão,

Sabe que tem que viver,

A vida que se renova na ESPERANÇA.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

As Quatro Estações



À tardezinha as aves rumam em bando para sul,



E com elas rumam meus sonhos e minha alma adolescente.



O que para trás fica de mim, sorve a poeira da estrada do desejo.




A noite esconde o olhar que sente saudade,



A penumbra recolhe o anseio,



A solidão afugenta o abraço.




De manhãzinha, o norte espera as mesmas aves que se foram no dia anterior,



E eu, aqui, quedo em mim as manhãs de primaveras,

Os fins de tardes de outonos de folhas avermelhadas ao chão,

A ternura de verões de calor e sabor intenso de sorvetes de morango,

sofro a nudez de invernos sem lã, sem afeto e sem o olhar que mareia os olhos,

Ao som das melodias de Vivaldi, companheiro do amor e da vida.