Na parede a leveza descrita em tons multicores rabisca a tela do olhar.
A música que ecoa à janelas entreabertas fende a luz que traspassa o afeto.
O piano está ali junto às folhas de outono e a pele esboça o frio que eriça a cortina.
É de calda, mas as mãos percorrem os cílios que sombreiam o sol que fere a face.
Enquanto o pensamento vôa, a minha alma ganha a brisa leve sobre a flacidez dos sonhos.
Flechas agudas de um guerreiro solitário que sobrevive ao silêncio de noites infindas.
As horas não passam e os neutrinos em bando me atravessam a alma transparente.
Assentada ali a poesia eclode como erupção vulcânica que faz parir montanhas altivas.
Do que adiantam as horas se o que preciso mesmo é que o tempo pare?
Deveria existir um lugar onde a gente saísse do tempo para a eternidade.
Um lugar onde a história não acontecesse tórrida e pueril,
Onde mundos paralelos e perpendiculares obstassem à correria do tempo.
Envelhecer às vezes é ruim; deprime saber que sou finito.
Gosto da idéia de eternidade como um ´eterno agora´.
O véu do templo se rasgou, quem o percebeu?
Da ferida saiu sangue e água, quem observou?
Uma nota em Ré Menor, um tom e a aurora esboça a nostalgia.
Fins de tardes onde o desejo é menino cerelepe que corre em becos de velhas ruas.
Um calafrio transe o corpo que espera, espera e simplesmente espera.
O que espera o corpo senão o amor, o calor, o abraço e a compreensão?
Hoje o meu nome é SILÊNCIO: palavra roubada no poeta que sofre calado.
Por que sofre o poeta? Por ser pequeno demais para transportar o infinito.
Sinto-me só assentado no banco da praça de invernos chuvosos.
O que espero? Quem me dera saber a resposta.
Minha alma dói, meu espírito anestesiado padece da incerteza.
Certeza meu senhor, é como uma cereja num floco de neve.
Calo-me quando não sei dizer ou definir o que na verdade sinto.
Acho que existe outras formas de mortes que não são só aquelas que matam o corpo.
Sendo assim, suspeito já ter morrido várias vezes.
Somente a alma que ama pode ressuscitar muitas vezes.
Renasço a cada verso e morro a cada palavra escrita na poesia concreta.
Sou poeta velho, profeta de tempos vindouros, de ressurreições e esperanças.
Alguma coisa em mim diz que ainda haverá um amanhã.
O fato é que o piano ainda está ali na sala-de-estar e as mãos se aquecem do frio.
O cicio do vento esfria o chão e a lareira luta luscofosca aquecendo pão e vinho.
Daqui do meu lugar vejo a rua através do espelho que espera o retoque do olhar que verte a
última lágrima que transborda a dor.
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