segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Ainda Quero Ser Criança!



Sugiro que este poema seja lido ouvindo-se a canção: http://www.youtube.com/watch?v=JQI0N0nZ5ho&feature=related



Poema para quem deseja ser feliz de verdade!





Ainda Quero Ser Criança!



De cima do muro onde estou agora,

                                   eu vejo o Sol por entre os dedos.

Por que isto? Não me perguntes a razão.

Meninos não explicam porque cruzam os dedos

                                   quando estão de mal uns com os outros.

Tampouco quando com os calcanhares fazem círculos

                                   sobre o chão para parar a chuva.

Meninos simplesmente sentem, amam, idealizam, sonham e realizam.

Eles têm os poderes mágicos da vida:

                                   Tocam as estrelas e brincam com a lua.

Não há teoremas para o coração que quer brincar com o vento.

A razão se emudece ante o Peter Pan,

                                   Que voa por ai com velhos lençóis seda nas costas.

O que dizer de Tarzans que gritam,

                                   Enquanto correm com seus corpos desnudos rua abaixo?

A razão da fantasia é a alma que agoniza entre universos paralelos: amor e ódio.

Entre muros que se erguem face à morte e à eternidade.

Saltimbancos; melodia de corpos frágeis que se esgueiram no tempo.

Como definir a imaginação quando a melhor boneca é aquela

                                   Sem braço, sem olho e descabelada?

O lúdico se faz insensatez para os olhos que não sabem amar.

Amar é enxergar quando os olhos estão grávidos de ternura, beleza e simplicidade.

Trocamos os velhos brinquedos de pau e de plástico dos longínquos quintais da vida,

Por outros que destroem, matam e arruínam os sonhos de nações inteiras.

Avança-se das armas de canudos de galhos de mamoeiros,

                                   Para carabinas, mísseis e fuzis.

Evolui-se dos botões de vídeo games,

                                   Partindo para aqueles das ogivas nucleares.

Da solidão daqui migra-se para o ódio dali.

Se os pais soubessem, brincariam mais com os seus filhos de pega varetas.

O que são os políticos? Meninos crescidos brincando de guerra e paz:

                                   Mal me quer! Bem me quer.

Os jogos que aprendemos na infância são reeditados na vida adulta real:

Batalha Naval, Banco Imobiliário, Xadrez, Policia e Ladrão. E com eles as trapaças!   

Eu queria ser artista plástico, para retratar o mundo dos meus sonhos.

Eu queria pintar e ouvir de longe o som do acordeão tocando

                                   A La Petite Wals, ao redor das flores.

O meu pai não brincou comigo. O perdôo, ele não teve infância.

Para alguns a guerra começa mais cedo e no lar.

Ele se foi e eu nem tive tempo para lhe chamar de amigo.

Eu cresci onde crescem os pombos e os pardais.

Minha alma é alada e prefere as cidades das cumeeiras.

Amo os sinos de igrejinhas tocados nas praças.

Me encanta o mundo quando a beleza é singela.

Quero o apito dos trens chegando à estação.

O saxofone tocado por um músico solitário em algum lugar na vizinhança.

Amo os cães quando ladram a distância.

O cantar do galo avisando o raiar do sol.

Sou menino que versa o amor nas palavras, doa a quem doer.

Já corri atrás de redemoinhos de ventos ligeiros,

                        Por que temer as tempestades?

Adoro o aconchego, quando a trovoada anuncia as chuvas.

Quando ao som da chuva da janela observo as árvores.

Quem viveu tanta ternura não precisa de canhões.

Minha arma é a poesia. Versa em mim o verso que repara a vida.  

Faço dos meus versos minha espada desembainhada e afiada contra o ódio.

Fio de prata que decepa a ignorância de quem pensa que cresceu.

Sou menino aventureiro! Sem batina, sem jargões,

                        Um canto elevado a Deus somente.

Sigo em meu navio mar afora.

Quero soltar balões!

Empinar pipas!

Correr por ai sem medo de ser feliz.

Quero os folguedos de arraiais com bandeirolas e festins.

Quero a Copa do Mundo com Brasil campeão.

Eu quero os campos de girassóis e uma taça de quentão.

Quero a família entre outras famílias marejando o amor.

Quero chimarrão e o frio de agosto.

Quero fazer felicidade, pois feliz só há cidade, quando o povo é feliz.    

Minhas travessuras são poesias feitas para quem deseja a vida.

Sou menino travestido de adulto,

                        Transcendência de mim mesmo no espelho.  

E na poesia eu pinto o mundo que o artista quer dizer.

Eu digo, por que se me expresso, eu vivo...

Minha poesia é partitura feita a pincel e nanquim.

Fragmentos de uma alma afeita à pintura a óleo com espátula.

Brinco com as palavras, enquanto reconstruo mundos.

Dou aos olhos dos que lêem o sabor das amoras colhidas no inverno.

Vinho que se bebe nas montanhas de Val Paraíso.   

Canção do adeus, quando o coração deseja o olhar que permanece.

Minha poesia é escrita a ferro e fogo.

Sou menino de olhar incerto que no rumo certo vai tocando a estrada.

Minha cegueira é minha lucidez.

Minha lucidez é minha ludicidade na cidade da minha solitude.

Sou favela que acolhe o Sol.

Sou vereda posta em verso para aqueles que cujos pés caminham entre nuvens.

Sou palavra que acolhe o grão.

Terra onde morre a semente para nascer esperança.

Lago profundo onde a luz da lua reflete sua transcendente claridade.

Luar que a saudade sela com um beijo.

Sim, eu acho que sou menino mesmo. A contra gosto!

Aprendi a perdoar os meus inimigos. Pobres coitados!

Vilões necessários para que a nobreza de um guerreiro venha a lume.

Meus heróis estão mortos.

Deixaram de brincar, cresceram e se tornaram vis.

Eu quero um coração puro. Sem julgar os outros.

                        Transparência!

Sem condená-los naquilo que eu mesmo sou: humano.

Eu não quero ser religioso.

                        Estes são odiosos, amargurados e se acham perfeitos.

Eu quero a fragilidade que me mantém aos pés do Cristo.

“Quem não se fizer como uma criança,

                        Não pode entrar no reino de Deus”.

Nicodemos indagou ao Mestre:

“Eu sou velho! Como posso nascer de novo?

Voltaria novamente ao ventre da minha mãe?”

Quero nascer de novo! E de novo! E de novo, e outra vez...

Crescer é bom quando o coração se sabe puro.

Dostoiéviski o descreveu em seu O Idiota!

Ser santo é ser como criança!

Eu quero a santidade que se vive na inocência de uma criança.

Às vezes penso que santidade de adultos,

É como aves de rapinas sobrevoando a presa.

                        Represa que vasa silenciosamente.

A criança em minha urge por um adulto mais sereno.

Um mundo mais justo, de outros meninos,

Que se sabem simples homens de bem.

Adélia Prado sentiu a dor do amor que sinto agora:

                        “Meu Deus,

Me dê cinco anos (...)

                        Mê dê a negrinha Fia pra eu brincar.

Me dê uma noite para eu dormir com minha mãe(...)

                        Me dê a mão, me cura de ser grande.

Ó Meu Deus, meu pai,

                        Meu pai”.  (Orfandade)

Daqui de cima do mundo, no muro ainda avisto o sol entre os meus dedos.



Poema de Robério Jesus

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