Por que escrevo poesia? Não sei dizer.
A poesia acontece em mim como nas cavernas se formam as estalagmites.
Há dias que não encontro um só grão de um verso para plantar na terra.
Outros há que o gotejar constante forma em mim rios caudalosos de lucidez e ternura.
O verniz teológico que esconde a minha alma decora a minha tibieza.
Não temo os deuses das teologias; outro dia os chamei para o jantar lá em casa.
Os deuses são antropológicos. Daí se parecerem tanto conosco.
Eles não são feitos de um material diferente do barro de onde viemos.
Se eles amam, é porque são poetas. Amam, porque sofrem.
A alma poética deve vir do além. Vem da dor e da saudade.
Pois para ele vai, toda vez que deseja expressar a vida.
Foi com os deuses que aprendemos a regar as flores.
Somente os deuses sabem florir o mundo e plantar jardins.
Os deuses vivem no além. Além do céu e das estrelas.
Além dos mares.
Além do que, ali e além é o seu lugar.
Eles existem no imaginário dos poetas. Ali, no lugar da saudade, do desejo e dos sonhos.
Mas há tantos aléns. De que além nasce a alma do poeta?
A minha alma nasce no sertão. No sertão nasce e morre o Sol e certos deuses.
Mas o sertão está além da cidade e da linha do horizonte.
Somente os poetas cruzam a linha do horizonte: porque viajam além do desejo.
Não temo a dura e fria realidade; pedra onde se amola a faca da ambição.
Mas “a estupidez insiste sempre”, disse Albert Camus.
Não são os rumos que determinam os caminhos do coração, mas este àqueles.
Nietzsche tinha razão: “temos a arte para não morrer da verdade”.
O meu senso do presente, do agora e do hoje não me abisma. Mente em mim.
O que me abisma é ver quão insensível e degradante tem se tornado o ser humano.
O anjo dá lugar à besta. A bela vergou-se à fera.
Além de mim, há outros tantos por ai,
Sedentos e fartos de uma desgraça chamada capitalismo.
Não sou niilista, sou poeta.
Os poetas possuem esperança e ainda crêem.
Eu creio em Deus! Creio como a minha mais alta verdade.
Isso eu não negocio com ateus, céticos, intelectuais ou secularistas.
Se eu sou poeta, sou místico.
Não é na poesia que alma se funde com o ser mais profundo do divino?
O poeta é aquele que o contempla, sente-o, percebe-o e em seguida descreve-o.
Porém, como tal, não o percebe como “fora de si”; discerne-o “dentro de si mesmo”.
É do além que eclode a poesia.
O divino a tudo perpassa. Atravessa as essências de tudo que existe.
Por que escrevo poesias? Talvez para fugir de tudo aquilo que se chama angústia.
Ou ainda, por ser tocado pelo divino, “por dentro” e “por fora” de mim mesmo.
Na poesia Deus é visto das janelas da alma.
Corre pelos becos de ruas lúgubres como menino que ama e brinca.
Ele desenha nas paredes, mapas de tesouros escondidos.
Deus cantarola, sorri e desperta a inocência em poucos homens nas cidades.
Espiritualidade e transcendência de uma sociedade que se afoga em seu próprio vômito.
A religião é selvagem.
O capitalismo também é.
Doce desgraça impetrada sobe a humanidade.
A sociedade vocifera, enquanto grita à procura de sua face humana, presa em espelhos.
Thomas Hobbes tinha razão: “Homo homini lúpus”: O homem é predador do homem.
Sabe o que eu penso?
O meu ser é como os anéis de Saturno; está cercado de tons e cores belas de esperança.
Castoriadis tinha razão, o meu ser é “caos”, é “abismo” é um “sem-fundo”.
Deve ser por isso que eu sou assim, esse imenso mar de amor, nebuloso.
Ao contrário das bestas, os poetas amam a tudo que tocam;
As bestas apenas devoram a tudo.
Dizem que estas são simplesmente estômagos: são auto e heterofágicas.
Ser “lobo” do mundo e de si mesmo é predação na consciência.
Quero uma alma poética.
Para que predar o mundo se dele dependo para existir?
Quem herdará o mundo que ora destruímos com nossas próprias mãos?
Eu já decidi.
Eu quero mesmo é ser poeta um dia.
Os poetas cultivam, plantam e semeiam como os deuses.
Predação e poesia não combinam.
A poesia é construção, é amor, é paz, é consciência apaziguada.
Poesia é criação, é arte, é enteléquia.
Por que eu escrevo poesia? Não sei dizer.
Escrevo porque minha alma se recusa a não eternizar meus pensamentos.
Que viva a poesia!
Que cessem as guerras!
Um Dia, certamente eu vou ser poeta!
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