Eu queria ser poeta de verdade um dia.
O que sou agora? Apenas um arremedo!
Os poetas são leves e sonhadores.
Minha poesia é bucólica e brejeira.
Causa-me espantos lidar com a palavra.
Eterno desassossego da alma.
Os poetas são como plumas, voam por ai.
Eu arrasto-me nesta minha carapaça feito a um cágado.
Tenho dos poetas apenas o desejo.
Acho que os poetas não desejam serem poetas,
Eles simplesmente são.
Na moldura do tempo pinto quadros inesquecíveis.
Somente a alma sensível poderá avaliar a pintura.
Sem pincéis ou espátula escrevo com tinta, óleo e sangue.
O que sou está circunscrito em meu corpo,
O que desejo ser é indizível, ainda não achei palavras.
Há quem não goste do que me tornei.
Cheguei aos quarenta e sou ainda indefinível.
Eu vivi parte da minha tenra vida definido pelos outros.
Quero viver o que me resta sendo indecifrável.
Um código apenas.
Um símbolo de eternas lembranças.
Sabe o que eu acho? Estou amando ser eu mesmo.
Livre, leve e esvoaçante.
No altar onde sou criatura orante, até respirar resulta em culpa.
Quero olhar o Juiz e dizer-lhe: errei por ter sido eu mesmo.
Desejei apenas ser sua imagem e semelhança!
Sabe por que quero ser poeta? Para ser lido mesmo depois da morte!
Por que quero ser lido? Não sei dizer.
Talvez seja narcisismo, talvez amor.
Talvez seja o medo de não ter sido ninguém.
Talvez!
Leio Rachel de Queiroz e ela não mais existe.
Leio Graciliano Ramos, José de Alencar e todos vivem vidas póstumas.
Esse ranço da eternidade talvez deixe em mim o desejo de ser eternizado.
Não quero ser indigente.
Quero apenas ser o que nem sei dizer!
Quero ser pássaro livre mesmo aqui nas minhas prisões.
O poeta é o único ser verdadeiramente livre.
Um poeta vai aonde quer, diz e sente o que quer.
E se houver culpa tê-la-á sentido na escuridão da subjetividade.
Se houver pudor seus vergões serão guardados.
Se houver medo o fará silente.
Mas terá vivido a tudo isso no mote da sua individualidade.
O poeta é aquele que transpõe abismos.
Um poeta é abismo.
O mundo é abismo.
A alma é abismo.
Ser ou não ser? Eis a questão!
Escrevo o que não sei se posso ser.
Sonho o que desejo ser.
Não ser é a negação do que sou todos os dias.
É a mais dura verdade contra a qual lutam todos os homens.
Queres ser feliz? Assista ao teatro da plateia.
Não levantes as cortinas, pois assim conhecerás o teatro por trás dos bastidores.
Queres ser santo? Afasta-te dos que dizem que são.
A santidade está ali onde há silêncio e discrição.
Queres conhecer o amor? Achega-te às crianças.
Eu insisto, um dia quero ser poeta.
Só os poetas sabem onde mora o amor, porque sensíveis.
Embora nem sempre o possam expressar, porque sibilantes.
A nudez do amor é o sorriso puro.
Sua face rubra é olhar inocente, sem vícios.
O amor é tudo isso que os poetas tentam dizer quando sentem saudade.
Sim, o amor é flor mantida na árvore e não guardada em cadernos.
É fruto colhido!
É abraço espontâneo.
É oração balbuciada sem querer nada em troca.
O amor é isso, que oscilando claudico em dizer.
É essa inesgotável força de ser e sentir que os brutos não são capazes de ter.
É criança sorrindo no berço enquanto dorme.
O amor é isso essa força estranha e tão desejada.
Um dia eu vou ser poeta.
Nem que seja por um dia.
Um dia eu vou ser.
Um dia eu vou.
Um dia.
Um.
Apenas um poeta.
Poema e Foto de Robério Jesus.
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